Despedida do primeiro e único técnico do Cerâmica: Entrevista com Steve Everett
Entrevista conduzida em inglês. Tradução para português por Christan e Tamara Shirk.
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Steve Everett – primeiro técnico do Cerâmica time de beisebol |
Steve Everett e sua família chegaram ao Brasil em 2006 como missionários batistas. Steve planejou trabalhar em ministérios esportivos, mas nunca imaginou que comandaria um time de beisebol num campeonato estadual. Tendo servido no quadro de pessoal na Igreja Batista da Feitoria para os últimos três anos, o Steve (47 anos) volta aos EUA esta terça-feira (18/05) para um ano de folga, mas não sem que tenha escrito seu nome na história de beisebol gaúcho. Em 2007 ele foi um de três fundadores americanos de uma iniciativa de ensinar o beisebol em Gravataí-RS e junto com os mesmos colegas o time de beisebol do Cerâmica A.C. foi fundado em 2008. Designado o técnico, ele esteve no comando do time desde sua estréia no campeonato estadual em 2008 até a 5ª rodada da temporada atual. Sob sua direção o time foi o vice-campeão gaúcho em 2009 e está classificado para a 2ª fase do Gaúchão deste ano. Cerâmica Beisebol falou com Steve antes de sua saída.
Ceramica Beisebol: Você tem sido o técnico de Cerâmica desde o início. O que é seu histórico de beisebol e sua experiência?
Steve Everett: Eu comecei jogar beisebol quando tinha 12 anos de idade na Little League e continuei a jogar no colégio e mesmo na universidade. Joguei principalmente como arremessador, mas também joguei muito na terceira e segunda base. Tive a oportunidade jogar todas as posições, inclusive receptor, mas realmente não gosto muito de ser receptor. Eu também joguei softbol por mais de 25 anos.
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Steve fala com seu arremessador |
CB: Você já teve experiência como treinador antes?
Steve: Adoro treinar crianças! Durante muitos anos nos Estados Unidos tenho sido um treinador de beisebol, basquete e futebol. Com beisebol eu fui técnico do meu filho mais velho (agora tem 21 anos) quando ele jogou na Little League. Ele começou jogar com 6 anos e jogou até o segundo ano do ensino médio quando foi no time “A” do seu colégio. Também durante esta época fui o treinador de um time feminino de softbol por seis anos e de um time masculino de softbol por dois anos.
CB: Além de ser o técnico, quais outros papéis você tem atuado no time?
Steve: Agora, eu somente jogo caso acho necessário. Se falta jogadores ou precisamos de uma injeção de “experiência” em campo ou no ataque. Eu adoro de ensinar a gurizada como jogar este esporte ao qual sou apaixonado! Algumas pessoas realmente pensam que o beisebol é lento e chato, mas acho que isso é resultado de uma falta de conhecimento do esporte. Eles não entendem todas as regras e estratégias do beisebol. Então gosto de ver estes guris começando a entender este grande esporte.
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Steve leva um momento durante o jogo para ensinar Jader sobre afastar da base. |
CB: O que era sua idéia para beisebol antes de chegar no Brasil em 2006?
Steve: Nada! Ouvi que brasileiros não jogam beisebol e não sabem como jogar. Então não pensei que jamais estaria jogando beisebol aqui. Mas trouxe algum equipamento para jogar e ensinar o softbol se tiver a oportunidade. Deus abriu uma oportunidade para mim ser envolvido num ministério de beisebol com um outro missionário em Gravataí no bairro Rincão.
CB: Fale mais sobre esta iniciativa no Rincão que foi lançado em Abril de 2007. Como surgiu a idéia e qual foi o objetivo do projeto?
Steve: Lee Geiger, um missionário, me perguntou se gostaria de ajudar com um ministério de beisebol no Rincão onde ele trabalhava plantando uma igreja. O propósito principal no início do projeto ou ministério era a criação de relacionamentos com a gurizada do bairro. Quisemos conhecê-los e fazer amizade com eles pensando em eventualmente os convidar à esta nova igreja no seu bairro. Podíamos ter usado futebol, imagino, mas decidimos usar um esporte “novo” (beisebol) para ver se isto pegaria a atenção deles para aprender um esporte americano diferente.
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Steve atua na primeira base na partida de abertura em 2009. |
CB: Como o projeto em prática comparou com suas expectativas pré-lançamento?
Steve: Eu realmente não soube o que esperar. Mas fui pegado desprevenido pelo fato que eles não souberam nada, absolutamente nada sobre o esporte. Era como treinar um grupo de crianças de 6 ou 7 anos, mas eles todos tiveram 18, 19 anos pra cima. Homens crescidos sem saber como pegar, lançar, e especialmente rebater um bola de beisebol. Realmente era algo muito estranho para mim observar.
CB: O que era o maior desafio para você pessoalmente?
Steve: A barreira de linguagem! Muitos dos termos e as palavras que são usados muito freqüentemente no beisebol eram bem difíceis de achar uma palavra em português que realmente fez sentido. Então às vezes nós acabamos usando palavras ou frases em inglês e eles têm aprendido a entender o que significa essas palavras e frases.
CB: Em novembro de 2007, um jogo de exibição foi realizado entre um grupo de norte-americanos e o Farrapos de Porto Alegre. Este grupo tornou-se o núcleo do time que foi formado logo depois em 2008 e a escalação na sua estréia no Gaúchão constou de oito americanos. Por que tantos americanos, e o que era a ligação entre o novo time e projeto no Rincão?
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Steve confere com o árbitro Yuri. |
Steve: A oportunidade simplesmente se abriu para nós jogar [neste amistoso contra Farrapos] e naquela época eu realmente não achava que quase nenhum dos brasileiros estava pronto para realmente jogar num jogo real. Então meu pensamento era para principalmente usar os americanos experientes ao começar com somente um ou dois brasileiros jogando e os outros observando e aprendendo. E eventualmente tirando os americanos e colocando os brasileiros em campo. Afinal das contas, a maioria dos jogadores do Rincão desistiram, com a exceção de Robson.
CB: O que eram suas expectativas e metas para o time ao começar?
Steve: Nós entramos na liga [gaúcha] de beisebol então. Acho que isto foi o ponto em que uma mudança aconteceu. Esta iniciativa tornou-se de um projeto de criar conexões e relacionamentos no Rincão a um projeto de ensinar e treinar brasileiros neste esporte de beisebol, ainda com o desejo de criar relacionamentos com brasileiros na esperança de eventualmente compartilhar com eles por que eu estou aqui em Brasil como missionário.
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Steve explica a seu filho Thomas algumas tácticas para um corredor na terceira base. |
CB: O time existe já há mais que dois anos; suas expectativas foram alcançadas?
Steve: Diria que “sim!” Temos competido bem às vezes e às vezes não tão bem. Mas geralmente eu sou agradado por onde começamos e onde estamos agora. Eu ainda fico meio frustrado às vezes quando vejo alguns dos mesmos erros, erros mentais, sendo feitos repetidamente. Acho que se estes caras tivessem um pouco mais de compromisso e comparecessem em todos os treinos e jogos, nossos erros diminuiriam muito.
CB: Hoje em dia a equipe consta quase inteiramente de brasileiros. Como e por que esta transição aconteceu?
Steve: Desde o início quando nós entramos na liga, minha idéia era sempre tentar desenvolver uma equipe composta principalmente de brasileiros. Como um missionário, eu fui treinado e ensinado para eventualmente tentar facilitar minha própria dispensa: com a plantação de uma igreja, um ministério de pequeno grupo, etc… Nós missionários queremos poder passar nossas responsabilidades e tarefas aos cidadãos. Esta equipe de beisebol é semelhante em que quis ver a equipe composta principalmente de brasileiros. Gostaria de permanecer envolvido como um treinador e de continuar com um ou dois norte-americanos experientes jogando no lado destes guris por algum tempo ainda enquanto eles continuam a aprender e crescer na sua habilidade e seu entendimento do esporte.
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Steve tem uma opínião diferente do árbitro sobre as bolas e strikes |
CB: Nenhum dos jogadores brasileiros, exceto um japonês-brasileiro e talvez mais um, teve experiência antes de comparecer num treino do time. Como você avaliaria o desenvolvimento técnico e tático dos novatos brasileiros?
Steve: Alguns têm talento natural. O esporte tem sido mais fácil para eles jogar e aprender. Tem sido muito útil a ter algumas destes tipos na equipe para ajudar com o desenvolvimento dos outros. Alguns dos outros que precisarem esforçar-se mais, fizeram alguns grandes passos em seu conhecimento e habilidades. Eu também gosto de ouvir alguns dos guris conversando sobre assistindo algum jogo profissional da MLB na TV e então discutindo algumas jogadas até mesmo me perguntando sobre o que aconteceu. Isso me mostra que eles realmente são interessados em aprender e jogar este esporte!
CB: Tem ficado satisfeito com o desempenho do time e com os resultados no campeonato estadual?
Steve: Às vezes, sim, e às vezes, não! Como um técnico eu realmente fico brabo com erros mentais. Erros físicos acontecerão; nenhum de nós é perfeito ou profissional. Mas erros mentais são algo diferente, uma falta de concentração ou se comparecessem mais nos treinos talvez eles tivessem sabido o que fazer numa certa situação. Mas então quando nós realmente demonstramos que sabemos como jogar este esporte e quando compitamos todo o jogo até o fim . . . eu realmente gosto disso! O jogo em Pelotas, por exemplo. Eu fui muito agradado com nossos jogadores e a maneira em que eles lutaram até o fim e ganhou um jogo muito apertado!
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Steve rebate na primeira partida em casa no Campo Esportivo da AFGD (Digicon). |
CB: Como você avaliaria o desenvolvimento do Cerâmica Beisebol como uma organização e um time ao longo de sua existência?
Steve: Tem sido muito agradável, especialmente este ano, porque acho que nós temos ganho muita divulgação e reconhecimento por vários meios de comunicação, tais como no site do Cerâmica A.C., no programa de rádio Drible da Vaca, além de vários jornais e revistas de Gravataí. Acho que isto realmente ajudou-nos a parecer mais como uma organização e um time que está participando num campeonato estadual, o Gaúchão.
CB: O time está participando no campeonato estadual pelo terceiro ano seguido e acabou como o vice-campeão da temporada passada. Como isto se compara com o que você podia ter imaginado lá atrás em 2007 quando começou o projeto no Rincão?
Steve: Não tive idéia nenhuma lá atrás em 2007 que nós seríamos onde estariamos hoje. Tinha pensado que nós seríamos um timinho que se reune de vez em quando para jogar ou simplesmente treinar. Mas agora estamos numa liga e normalmente competimos muito bem.
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Steve explica como rebater em um dos primerios treinos no Rincão em 2007 |
CB: O que tem sido a parte mais agradável de seu envolvimento no time e no beisebol aqui em Rio Grande do Sul?
Steve: O desenvolvimento de um punhado de jogadores. Agrada-me muito a observar os jogar e produzir resultados bons num jogo. Também, foi muito agradável de ter três de meus jogadores convidado ao participar num torneio em São Paulo (no final só dois foram).
CB: O que mais frustrou ou decepcionou você?
Steve: Às vezes, uma falta de compromisso! O não-comparecimento nos treinos, especialmente sem avisar um dos treinadores para dizer que não pode vir treinar. Também, a falta de produção ao bastão no ataque. Às vezes parece que nossos guris nunca tiveram qualquer treinamento de rebatimento do jeito que nos levamos tantos “strike outs”.
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Steve celebra a corrida do Robson durante a estréia na Liga Gaúcha |
CB: Você parte para um ano de folgo nos Estado Unidos. O que acontecerá com o time até sua volta?
Steve: Minha esperança e oração é que as coisas continuem em quanto estou fora. Com a ajuda de alguns outros missionários, ajudando com caronas e tal, acho que isto podia acontecer.
CB: Você tem qualquer plano ou expectativas para você e o time quando você volta para o Brasil?
Steve: Minha esperança e oração é que nós eventualmente podíamos conseguir nosso próprio campo em algum lugar! Espero ver nos desenvolver na área de arremessamento. Se não tiver arremessamento bom, você não irá muito longe no beisebol! Mas acho que nós temos mais alguns guris que nós podíamos começar a treinar para ser arremessadores e podíamos ser muito competitivos no morrinho!
Cerâmica Beisebol agradece Steve pelo tempo fazer esta entrevista durante os dias agitados na preparação para a mudança pros EUA. O time também agradece ao Steve pelo seu grande investimento no ensinamento, treinamento, e desenvolvimento desta equipe de novatos brasileiros. Não é possível exagerar sua importância e sentiremos sua falta. O time deseja para Steve e sua família um ano maravilhoso e agradável com seus familiares e amigos; bom descanso e rejuvenescimento; e saúde e segurança nas suas viagens. Grande abraço, Steve!
Confira: galeria de fotos do técnico Steve.
Valeu Steve por todo seu trabalho com o esporte no estado, uma ótima viagem e esperamos nos encontrar em 2011…
Senti um pouquinho de melancolia na entrevista, hein. Pessoal por aí vai ficar com bastante saudades do Steve pelo jeito. Hehehe..
Um forte abraço, boa viagem e bom descanso. E que o Cerâmica continue sempre forte por aí.